domingo, 13 de outubro de 2019

A idolatria materna rouba a glória de Deus

Uma das consequências maravilhosas de um casamento bíblico é a possibilidade de se ter filhos, e poder ensiná-los à luz das Escrituras. Textos como Provérbios 22.6 e Salmos 12.3-5 ressoam em nossas mentes todas as vezes que o assunto vem à tona. Sem dúvida, ter filhos no Senhor é uma bênção, mas pode se transformar em maldição caso os nossos corações estejam voltados para eles em vez de para Aquele que nos agraciou.

O que mais chama a atenção é o comportamento dos pais, principalmente a mãe, no que tange ao amor que é dado aos filhos quando eles nascem. Provavelmente você já deve ter ouvido, ou visto em alguma postagem de rede social, a mãe retratando quão indescritível é o amor que ela sente pelo seu infante. Adjetivos faltam a ela para exprimir quão profundo é esse sentimento. E o mais controverso é que, mesmo dentro do próprio meio cristão, isso tem sido aplaudido, perpetuado e até mesmo estimulado.

Não estou pondo em xeque o sentimento materno pela criança. Afinal, qual é o pai ou a mãe que não nutre tal acalento pelo filho mesmo antes de ele nascer?! O problema está naquilo que chamo de "idolatria materna", ou "idolatria à maternidade" - que é uma condição de anestesia dos pais, principalmente a mãe, pelo filho, chegando ao ponto de transformá-lo num ídolo, e substituindo Deus por esse novo objeto de amor, devoção e adoração.

O que atesta essa condição idolátrica é justamente o fato de a mãe não conseguir definir o seu amor emotivo pelo filho. Palavras como "indescritível", "sobre-humano", "absurdo", "sem igual", utilizadas para expressar o amor que sentem por seus filhos, são parecidas com aquelas que usamos para definir o amor que o próprio Deus tem para conosco, e que deveríamos buscar retribuí-lo semelhantemente. Talvez, o próprio fato de a mãe se expressar desse jeito já poderia ser uma vantagem sobre os homens, no fato de retribuírem aquele amor divino ao Criador. Mas, infelizmente, esse amor materno acaba se transformando num fim em si mesmo, e o que deveria ser motivador torna-se estático.

Quando digo que isso atinge principalmente as mães, refiro-me ao fato de ser ela a incubadora daquele infante, já que o carrega por nove meses em seu ventre, além de passar por todos os ciclos hormonais e fisiológicos possíveis a fim de manter aquela vida ativa e crescendo. O pai não é nem coadjuvante. Antes, acaba se tornando apenas uma figurante, tentando sofrer junto, mas sem possuir as mesmas dores por quais a mãe passa. Mas ainda assim, ele também não deve ser desresponsabilizado pela idolatria materna que acontece. Pelo contrário, se o pai cristão agisse como pastor, guia e líder de sua esposa, saberia muito bem como proceder a fim de reconfigurar essa idolatria à maternidade para a adoração (e gratidão) ao Deus verdadeiro que bem-aventurou a sua esposa.

Quando a criança nasce, é natural receber mais atenção e cuidado por parte dos pais, e principalmente da mãe, haja vista que como qualquer mamífero, ela precisa ser amamentada, acalentada e se sentir segura da mesma forma que era enquanto estava no ventre. O período em que os pais ficam sem fazer sexo é uma condição em que o próprio Deus abençoa a fim de que eles possam prover o necessário para aquela criaturinha que acabou de vir ao mundo. O problema surge quando o coração dos pais, após esse período de "castidade", se volta unicamente para o filho, o que faz com que cada cônjuge abandone um ao outro. Quando isso acontece, os pais não percebem como abrem brecha para a ação do diabo em seu casamento. A idolatria materna é o primeiro passo para o esfriamento espiritual e, consequentemente, marital.

Na Bíblia, lemos a história de Ana, a mãe de Samuel, que, após prometer a Deus que se tivesse um filho, o entregaria a Ele para servir no Templo, teve seu ventre agraciado. E ela realmente o entregou para o ofício sacerdotal. Ana cuidou de Samuel até a idade devida para ele começar o seu treinamento aos pés do sacerdote Eli. Ana todos os anos o visitava. Imagino que se essa mentalidade atual da idolatria materna atuasse naquela época, provavelmente Ana teria procrastinado os dias de Samuel na sua casa o máximo possível, a fim de que ou Deus ou o sacerdote Eli esquecessem do que ela havia prometido. Por que ela agiria assim? Porque a idolatria materna, além de comprometer o entendimento, acaba criando uma visão dualista de posse, em que começa-se a pensar naquilo que é meu e no que é do Senhor. 

Quando não compreendemos que tudo aquilo que temos pertence ao Senhor (que nada que temos é nosso por si só), o nosso coração tende a se voltar para aquilo que pensamos mais amar. No caso da idolatria materna, o coração da mãe (e/ou do pai) volta-se ao filho de uma forma quase sacerdotal. Por exemplo, se fosse para a mãe escolher quem ela salvaria num naufrágio, o marido ou o filho, caso ela possua essa idolatria à maternidade, não pensará duas vezes em escolher o filho. É possível que ao pai, o mesmo pensamento ocorra. Ou seja, ao agir assim, ela demonstra que compreende erroneamente, e equivocadamente, o que de fato é o amor bíblico, amor esse que abarca o entendimento que devemos possuir acerca dos outros tipos de amores (amigo, cônjuge, filhos etc.).

O amor divino, amor paterno de Deus para com seus filhos, é o melhor exemplo que podemos ter sobre como amarmos com verdade, responsabilidade e sem idolatria. O Deus que nos ama nos ensina, por sua Palavra, Quem de fato devemos amar de uma forma indescritível, absurda e sem igual, em primeiro lugar. Só quando amamos a Deus com todo o nosso coração, todo o nosso entendimento, todas as nossas forças e toda a nossa alma, é que poderemos amar o nosso próximo, seja ele cônjuge, filhos, amigos, parentes e desconhecidos, de uma forma que verdadeiramente glorifique ao próprio Deus.

Se você insiste em uma indefinição do amor que sente pelo seu filho, tome cuidado. Pode ser que você já esteja flertando com a idolatria materna e nem sabe. Ao achar que está agindo bem, pode não estar sendo bíblica. Ao achar que está fazendo um sacrifício, pode não estar sendo obediente. Ao achar que está sendo exemplo para seu filho, pode estar fazendo um desserviço para o Evangelho de Cristo.

Nossos filhos começarão temer e amar ao Senhor quando perceberem quem nós mais tememos e a quem mais amamos. Se eles descobrirem que os transformamos em pequenos ídolos, então nossa pregação será vazia, e nossas orações não passarão do teto. É quando criamos (e amamos os) filhos para o Senhor, e não para nosso próprio bem-estar, é que estaremos com nossos corações voltados para glorificar a Deus, amar a Sua Palavra e depender do Espírito Santo. Não deixemos que a bênção do Senhor (o filho que Ele nos dá) se transforme em maldição (dar o nosso coração para nossos filhos, e não para Deus).

domingo, 29 de setembro de 2019

Teologia, sim, também é para crianças

Há um certo pensamento no meio cristão que parece ser "contrário" ao ensino da teologia às crianças - parece atingir pais especificamente. Coloco entre aspas a palavra contrário pois não é que os pais achem que a teologia nunca deva ser ensinada, mas que eles demonstram não levar tão a sério o ensino dela em idades tão precoce. É como se a teologia fosse vista como um tipo de sociedade secreta, onde só a partir de determinadas idades o indivíduo poderá ser apresentado a ela e terá o senso correto para ser ensinado. Porém, tal pensamento não é bíblico.

Alguns pais podem achar que ensinar a Bíblia é diferente de ensinar teologia, no entanto, ao se executar o primeiro, deve-se possuir alguns conceitos por trás do que é ensinado, a fim de facilitar o entendimento das crianças. O pai que lê com seu filho João 3.16 deve ter em mente que ali naquele simples texto contém doutrinas teológicas como soteriologia e escatologia. Não quer dizer que a criança tenha que saber de pronto o que dizem as diversas correntes teológicas, mas sim que o básico da teologia deve permear os estudos com seus pais.  

Tal como o ensino bíblico, o ensino teológico também está englobado na instrução de Paulo a Timóteo quando ele diz: "Toda escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção e para a instrução na justiça, para que o homem de Deus seja apto e plenamente preparado para toda boa obra." (2 Tm 3.16,17). Como os pais poderão exigir dos filhos conduta cristã quando eles forem adolescentes e jovens se quando eram infantes não tiveram nenhum tipo de instrução e ensino bíblico-teológico por parte dos pais? Eis uma prece difícil de ser atendida.

Algo que acomete muitos pais cristãos no que diz respeito a esse cuidado para com os filhos é o fato de eles terceirizarem esse tipo de educação cristã-teológica. Muitos pais não exercem seus papeis de líderes de seus filhos no lar, não estudam com eles a Bíblia, muitos sequer dão o próprio exemplo em meditar e ler as Escrituras, e acabam confiando seus filhos à escola bíblica dominical. O problema é que os filhos vão para essas aulas muitas vezes sem saber o básico da vida cristã e, se lá tiver alguém comprometido em ensiná-los, eles até podem adquirir alguma noção, mas se for apenas alguém preocupado em entretê-los, então eles voltam para casa mais vazios do que quando chegaram na igreja.

Quando pais se comprometem com a educação teológica de seus filhos, proporcionalmente a cada idade, eles estarão fazendo um favor tanto aos filhos como para a sociedade em que vivem. Lembrem-se que um dos maiores exemplos de educação teológica vem do próprio Salvador. Jesus Cristo possuía doze anos quando estava no templo discutindo com os mestres da lei, e os próprios se impressionavam com sua inteligência da Escritura. Hoje, mesmo dentro do seio cristão, adolescentes de doze anos insistem em agir como bebês mimados, não se interessam em ir aos cultos, tampouco em estudar a Bíblia, e muitas vezes com o consentimento dos próprios pais. Se fôssemos a fundo para saber o porquê, é capaz de encontrarmos justamente essa omissão de não tê-los ensinado teologia quando eram infantes.

Teologia não salva ninguém. O que ela faz é te capacitar para compreender melhor a história, a sociedade, e principalmente, o que a Bíblia instrui. 

William Lane Craig, na introdução do seu livro Em guarda, resume bem como deveria ser a preocupação dos pais com o ensino teológico para seus filhos: "Os pais devem fazer mais do que apenas levar seus filhos à igreja e ler histórias da Bíblia para eles. Pais e mães precisam ser bem treinados em apologética para que sejam capazes de explicar aos filhos, desde pequenos e cada vez com maior profundidade, por que cremos naquilo que cremos. Honestamente falando, acho difícil de entender como casais cristãos, nesses tempos em que vivemos, podem correr o risco de trazer filhos ao mundo sem terem recebido um bom treinamento em apologética como parte de seu ofício de pais.".

É isso. Os pais deveriam ter uma preocupação maior tanto com a alma de seus filhos como com a integridade e postura deles face aos desafios dos tempos atuais. A teologia não substitui a Bíblia; antes, complementa e expande o que Deus nos deixou escrito. Ela sempre terá como base aquilo que a Bíblia instrui. Achar que as crianças não podem compreender a teologia da cruz, a teologia do reino, a teologia da salvação, simplesmente por supor que elas não possuem idade suficiente para isso é quase como uma negação do poder e da soberania de Deus na vida delas.

O interessante nesse pretenso temor dos pais por ensinar teologia aos seus filhos é que eles acham mais fácil a criança aprender matemática, geografia, ciências, física, química, robótica, e todas aquelas disciplinas escolares, mas não teologia. Talvez a preocupação com o futuro profissional dos filhos acabe por ofuscar a real importância em alimentar suas almas com aquilo que é bíblico e teológico. E isso pode ser um baita problema quando imaginamos no que eles podem se transformar caso não estejam firmados na rocha correta.

Que o estudo sincero e predisposto da Bíblia possa conduzir os pais à teologia. Que os pais não se enganem achando que só o pastorado ou as lideranças são capazes de instruir seus filhos teologicamente. Que por meio de exemplos como os de Samuel, Daniel, Davi e Jesus, os pais possam compreender a importância de ensinar teologia aos seus filhos. Que os pais possam, enfim, saber que nenhum trabalho no Senhor é em vão (1 Co 15.58), principalmente ensinar teologia aos seus filhos desde o momento em que eles pronunciam as primeiras palavras.

domingo, 15 de setembro de 2019

Não seja um "adultescente" cristão

Nem sempre o cristianismo que dizemos professar corresponde à maturidade espiritual que dizemos possuir. Com isso, não é surpresa nenhuma vermos adultos cristãos se comportando mais como adolescentes ou crianças de colo do que como verdadeiros guerreiros do estandarte cristão.

Paulo em 1 Coríntios 13.11 revela que quando ele "era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança; mas, assim que {chegou} à idade adulta, {acabou} com as coisas de criança." O fato é que tudo na vida do ser humano tem um tempo e um momento. Paulo teve o tempo, antes de ser integrado a Cristo, de agir como quem não tem pastor, como quem pensa que tudo é brincadeira e fanfarras. Mas, a partir do momento em que o Evangelho do Reino lhe concede vida abundante, enfim, ele começa a crescer, amadurecer, e parar com as coisas de criança, fossem elas pensamentos ou atitudes infantis, raciocínios ou conversas imaturas.

De fato, a vida do cristão possui essas fases de imaturidade, onde ele ainda tem que beber leite em vez de comer alimento sólido. Porém, como qualquer processo de crescimento humano, a vida espiritual também requer que o cristão não se contente unicamente em beber aquele leite espiritual. E isso faz toda diferença se quisermos ser testemunhas de Jesus Cristo. Cristãos que já possuem anos de conversão, mas que ainda agem como se fossem neófitos, demonstram possuir uma falha no que diz respeito à sua própria caminhada cristã. Muitos acabam não percebendo, e findam por se envolverem em determinadas atividades eclesiásticas sem possuírem o mínimo exigido biblicamente para tal (cf. 1 Timóteo 3). O resultado, mais dia menos dia, não será dos melhores.

A despeito dos vários textos bíblicos que conclamam o cristão a progredir no amadurecimento de sua fé em Cristo e de sua caminhada cristã (cf. Salmo 90.12; Colossenses 4.6; Efésios 5.15; 1 Tessalonicenses 4.1; Filipenses 4.14; 1 Coríntios 2.16; Tiago 1.5; 2 Pedro 3.18 etc.), ainda assim muitos dos adultos cristãos optam por viver uma vida cristã de eterno divertimento, entretenimento e licenciosidade. Com isso, acabam sendo o exemplo negativo de modelo cristão para seus filhos (se assim possuem), colegas de trabalho, vizinhos ou familiares. 

O padrão a ser perseguido não é o dos pais da igreja, dos teólogos reformados, dos puritanos ou dos pregadores da velha escola do século passado, conquanto muitos deles sejam exemplos de santidade e maturidade cristã, mas sim Jesus Cristo, esse sim que é o modelo perfeito para o amadurecimento do cristão. Entretanto, ainda que os adultos cristãos afirmem segui-lo e professar seus mandamentos, na realidade o que pode ser visto é um ateísmo prático, onde Cristo pouco (ou nada) faz parte das diversões, estudos bíblicos (individual ou em grupo) e das conversas deles.

Ao cristão não lhe é proibido rir ou contar piadas, desde que isso não se torne o seu ideal de vida. O problema surge a partir do momento em que as conversas, reuniões e discussões (aparentemente bíblicas) são pautadas unicamente por querer transformá-las em motivo de piada ou chacota gospel. O adulto cristão que sente alegria em ser o bobo da corte de sua turma demonstra tanto imaturidade como um tipo de complexo de Peter Pan, querendo agir e ser visto como uma eterna criança. Só que agir assim não é o que a Bíblia orienta. 

Que os adultos cristãos possam amadurecer na caminhada cristã, não entristecendo o Espírito Santo que neles habita (se de fato eles são cristãos).