quinta-feira, 30 de agosto de 2018

A lei que muitos utilizam sem entender


A lei da demanda e da oferta é essencial para compreender como se comporta a oscilação dos preços de produtos e serviços. Insistir que o Estado seja o agente controlador de preços é redundar nos mesmos erros históricos da Rússia estalinista, dos Estados Unidos em seus controles de preços de aluguéis de imóveis, e no Brasil em fins dos anos 80 no congelamento de preços de mercadorias na era Sarney. Entregar tal função a um planejamento central governamental, achando que ele é a solução para os problemas econômicos, é como estancar o rombo no casco do navio com explosivos em vez de betume.

Se um produto está escasso e a procura aumenta, é justo e moral ao vendedor aumentar o valor de venda a fim de contrabalançar com a sua demanda, enquanto que ao cliente é dado o benefício da escolha entre pagar o que se oferece ou não. Caso não haja compradores, o vendedor deverá agir com lógica diminuindo o valor ofertado até uma margem em que seja razoável para o consumidor pagar para tê-lo. Se o Estado entra como um agente que estipula o preço “justo” a se pagar, estará contribuindo para dois possíveis cenários caóticos da economia: excedentes e escassez.

As pessoas compram e vendem, pois os preços são o reflexo do valor que damos às coisas. Você só compra o vestido ou o carro novo por necessitar tal produto ou por querer esbanjar. E o vendedor só lhe vende, pois ele está necessitando do dinheiro para obter seu lucro. O verdadeiro comércio é feito de atos voluntários por pessoas que valoram o que necessitam. Quem melhor regula a demanda e a oferta é o próprio mercado na figura de seus agentes, os consumidores, mas parece que o Estado não permite que aprendamos a negociar por conta própria. O controle de preços não se mostrou viável em nenhum lugar onde foi implementado. Na Venezuela, foi feito semelhante com o barril de petróleo até estourar no que é visto hoje. Esse é o começo para as recessões econômicas. Na cabeça dos líderes estatistas, liberdade é um conceito que não se aplica aos governados.

Muitas pessoas acreditam que vivemos no Brasil debaixo de um sistema capitalista, em seu sentido puro (ainda que elas mesmas não saibam o que seria isso) e, por causa desse equívoco, o capitalismo acaba se tornando o patinho feio da história. É importante salientar que o capitalismo a que me refiro é aquele derivado do livre mercado, como tão bem pontuado pelos liberais clássicos, dentre eles Adam Smith. O que temos no Brasil é uma deformação, um engodo, uma falácia – algo denominado de corporativismo, também comumente conhecido como “capitalismo de laços”.

O livre mercado, pelo contrário, possibilita que cada indivíduo realize trocas voluntárias e favoráveis a cada um que está interessado em adquirir produtos e/ou serviços. No corporativismo há um conluio entre empresas e o Estado, e essas empresas, ao quererem manter o monopólio daquele determinado setor, recorrem ao Estado, na forma de suas agências reguladoras ou políticos com certa influência para legislar em benefício tanto próprio quanto do empresário interessado. O resultado é que nessa transação oculta, o consumidor sai como o maior prejudicado, haja vista que sua liberdade de escolha é descartada.

Exemplos disso podemos ver no caso recente do Uber, em que sindicatos de taxistas agindo com interesse exclusivo de monopólio agiram politicamente para que o aplicativo, se não fosse terminantemente proibido no país, fosse “regularizado”. O problema é que essa regularização não é visando o benefício do consumidor. Tal argumento é usado como cortina de fumaça. O interesse real é que aqueles há mais tempo no mercado – no caso, os taxistas – não tenham seus negócios “ameaçados” pela inovação. Em vez de melhorarem seus próprios serviços, eles optam por manter a defasagem e o atraso, obrigando a população a conviver com a obsolescência e o comodismo dos motoristas. Há uma demanda por melhores serviços, mas o atendimento a ela esbarra no corporativismo de tais empresas e no gigantismo estatal por mais protecionismo e leis que impeçam a livre concorrência.

De um modo direto, enquanto o Estado não diminuir suas atividades na economia, continuaremos reféns em nossa própria casa.

quarta-feira, 29 de agosto de 2018

Duplipensar na história e no dia a dia


Duplipensar é um termo cunhado por George Orwell em seu livro 1984. Refere-se ao fato quando uma pessoa possui duas ideias antagônicas em mente, e faz uso das duas. No livro, há vários exemplos desse comportamento. O Ministério da Paz, que era um dos quatro ministérios que o Partido utilizava para se assegurar no poder, era preocupado com a questão da guerra. Esse ministério era o encarregado de fomentar, a todo momento, que o país encontrava-se à beira de uma guerra e, para evitar tal fim, era preciso fazer o quê? Guerrear primeiro. O Ministério da Paz promovendo guerras! Nada mais que duplipensar.

Depois de quase setenta anos, tal comportamento não mudou. Somos bombardeados diariamente com o duplipensar. Seja no judiciário, no governo, pela classe artística, pelos intelectuais midiáticos – intelligentsia –, seja pela própria mídia, seja no mundo acadêmico e até no trabalho. Enfim, o duplipensar se estabeleceu a ponto de as pessoas, tal como no livro de Orwell, acharem normal esse tipo de pensamento dúbio e antagônico.

Nosso salário é tolhido na forma de impostos – ou "roubo legalizado" –, e o Estado diz que estamos realizando “contribuições”, seja para a previdência, seja para o FGTS, seja para a conta de luz (a tal da “contribuição” para iluminação pública). Isso é duplipensar.

A elite judiciária se apresenta como a guardiã do direito, mesmo que essa guarda seja baseada numa pretensa interpretação das leis e que, em muitos casos, revela-se um descalabro para a sociedade. São togados que julgam o réu pelo crime de latrocínio, mas culpam a vítima por ter reagido ao assalto. Isso é duplipensar.

Temos um classe artística que tacha aqueles que boicotam e se indignam contra determinadas exposições de arte, envolvendo “artistas nus” com crianças, de intolerantes, fascistas, censuradores e toda sorte de adjetivos calorosos, mas quando são os mesmos artistas quem boicotam alguma marca famosa por uma propaganda que eles dizem ser “conservadora”, chamam isso de liberdade de escolha. Esses mesmos artistas que dizem lutar pelos pobres e miseráveis, mas que os tais não teriam dinheiro nem para meia-entrada em seus shows. Ingressos com valores que dariam para alimentá-los por uma semana. Artistas que buscam a fama e o sucesso, todavia transitam com seus seguranças a fim de impedirem a aproximação de populares pedindo autógrafos ou para tirarem fotos. Artistas que possuem programas de TV que dizem defender os “movimentos sociais” (dos negros, dos gays, das mulheres etc.) e que pleiteiam um mundo de mais diversidade entre as relações, embora que em seus próprios círculos de amizades, nas fotos que tiram, vemos uma “diversidade homogênea” – amigos de mesma cor e classe social. Isso é duplipensar.


Thomas Sowell, em seu livro Os Intelectuais e a Sociedade, dá uma abrangência bem maior ao conceito de intelectual que estamos acostumados a ver. Intelectual não é apenas aquele ser de gabinete, douto na leitura de inúmeros livros e que, de tempos em tempos, retira sabedoria de seus pensamentos. “Intelectuais”, no livro e nas palavras de Sowell, são aquelas “pessoas cujas ocupações profissionais operam fundamentalmente em função de ideias – falo de escritores, acadêmicos e afins.” Esses intelectuais são os que formam a opinião de ativistas sociais, de editores e jornalistas, de professores da rede pública e privada de ensino e, principalmente, de políticos sedentos por poder. Os intelectuais dizem se preocupar com os rumos da educação no país, exigem mais dinheiro público nas escolas e universidades públicas a fim de melhorar a infraestrutura dos prédios e o desempenho dos alunos, no entanto, são esses mesmos intelectuais que criticam negativamente formas de ensino não convencionais – educação domiciliar, por exemplo –, e que, por sua vez, já demonstraram ser bem mais benéficas e com maior aproveitamento para os alunos. Isso é duplipensar.

A mídia atualmente faz o mesmo papel do Ministério da Verdade, como em 1984 de Orwell. Ela se encarrega de passar apenas aquelas informações que julga ser interessante para a população e que se enquadrem com a visão dela. E com isso, os telespectadores passam a ser enganados sobre o que acontece no mundo de verdade. Chega ao ponto de jornais e redações fazerem campanhas contra fake news, embora esses mesmos jornais e redações sejam os que mais fomentam fake news. Isso é duplipensar.

No emprego público ocorre algo também bem interessante. Funcionários públicos, que recebem altos salários e gozam de estabilidade, não podem ouvir falar em privatização. Defendem até o fim que se mantenha o status quo do funcionalismo público, mesmo que façam parte de uma empresa que só dá prejuízo para a sociedade e o erário, que privatizar é coisa de lunático e toda sorte de expressões sem o mínimo de racionalidade. Contudo, esses mesmos funcionários públicos são os que mais se utilizam de serviços privados, seja uma escola ou faculdade, seja uma clínica ou hospital, seja um transporte. Enfim, nos momentos em que estão desfrutando de tais serviços privados, aproveitam para tecer comentários contra privatizações. Isso é duplipensar.

Os maiores crimes da história foram causados por ditadores que  praticavam o duplipensar. Hitler exterminou judeus com a desculpa de estar fazendo um bem para a sociedade ariana (“matar é justo”). Stalin usou as próprias reservas de alimentos dos ucranianos para matá-los de fome (Holodomor). Ele expropriou por completo as suas fontes de abastecimento. Mao fez algo semelhante na China. Fidel e Che Guevara minaram a economia cubana e, enquanto se jactavam de possuir as melhores bebidas, os melhores charutos e realizarem viagens a outros países, proporcionavam ao povo miséria e pobreza. Eles se enriqueciam através da pobreza do povo. É semelhante ao que Chávez fez com a Venezuela, assim como seu pupilo Maduro. As ditaduras sempre ocorreram por meio do duplipensar. Defende-se uma ideia, mas pratica-se o contrário daquela ideia, crendo piamente de que essa ideia, para dar certo, será preciso fazer tudo errado. O socialismo é assim.

O socialismo se arvora na pretensa busca por igualdade quando, na verdade, o que se deseja é o estabelecimento de um planejamento central, um Estado altamente controlador na figura daqueles que assim estão no poder. E essa busca por igualdade deve passar, antes de tudo, pela inviabilização da condição de liberdade do indivíduo. O socialismo requer que, para todos serem iguais, todos terão que se tornar escravos. É daí que se faz necessário um planejamento centralizador e um controle coercitivo para manter as pessoas na mesma igualdade de pobreza. Nada mais que o puro duplipensar orwelliano.